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O Conselho Presbiteral,
segundo o Código de Direito Canónico, é
uma espécie de senado do Bispo que representa o
presbitério. Compete ajudar o Bispo no governo
da diocese nos termos do direito, para se promover o mais
possível o bem pastoral do povo de Deus que lhe
foi confiado.
De 2013 para 2014, a sociedade em que nos inserimos continua
a sofrer de alguns condicionalismos graves, que pesam
muito sobre a generalidade das pessoas e das famílias.
Por razões sobretudo financeiras, económicas
e laborais, reduziram-se muitas possibilidades imediatas,
em especial no trabalho, no rendimento e nas reformas,
e esfumaram-se muitas aspirações de futuro,
particularmente para jovens e desempregados de meia idade.
Naturalmente decorrem daqui muitos dos problemas que nos
chegam, ou de que nós próprios devemos abeirar-nos.
Nas instituições sociais que mantemos e
no atendimento pessoal que prestamos, aparecem casos difíceis
e por vezes dramáticos que têm diretamente
a ver com a presente situação geral do país
e as muitas frustrações que ocasiona.
Porque não se trata apenas de nós, o Papa
Bento XVI (Caritas in Veritate) e o Papa Francisco (Evangelii
Gaudium) caraterizaram a presente “crise”
em vários aspetos que importa reter: duma economia
«que mata», por ter pouco ou nada em conta
a primazia da pessoa humana, a um incorreto entendimento
do progresso e do desenvolvimento, que os retém
na mera acumulação quantitativa e alarga
o fosso entre quem tem muito e quem não tem o suficiente,
ou mesmo nada; dos grandes atentados à existência
humana, da conceção à morte natural,
ao alastramento duma deficiente antropologia, que não
respeita a totalidade psicofísica do ser humano,
na complementaridade homem – mulher e no envolvimento
familiar básico e estrutural; do esvaziamento cultural,
que dissolve valores globais e se fica por impressões
e afetos, à dificuldade em manter verdadeiros diálogos,
em que se escutem e partilhem realmente convicções
e projetos; da grande massa de informação
mediática, que mais atordoa do que comunica, à
imponderação dos juízos e das decisões
que se tomam à pressa e à escassa aprendizagem
da escuta, da leitura e da contemplação…
Tudo isto nos “bate à porta” na ação
pastoral diária e nos desafia fortemente enquanto
Igreja. Apesar das circunstâncias específicas
da “crise” atual, não é a primeira
vez que os cristãos e as suas comunidades são
interpelados em ser para o mundo o sinal vivo de um Deus
que não desiste de sustentar a criação
e de a recriar em Cristo, com a força do Espírito.
Mesmo a interpelação que tantos nos fazem,
crentes e não crentes, para agirmos, para falarmos,
para reavivarmos a esperança, torna-se para nós
um verdadeiro “sinal dos tempos”, que só
nos pode comprometer, mais e mais, nesse sentido.
(...) É a nossa missão, ilustrando com experiências
de agora o que os Atos dos Apóstolos nos contaram
para sempre. Com tudo o que lá vem descrito, de
essencial e garantido: o anúncio geral da paternidade
divina e da pessoa de Cristo, em cuja Páscoa se
realizam as aspirações de todo o povo e
nação; a obra do Espírito, criador
de comunidades que se expandem em missão; a colaboração
dos ministros ordenados (Paulo e os seus companheiros)
e dos fiéis leigos (o casal Àquila e Priscila
e tantos outros); sobretudo a certeza de que a evangelização
do mundo é essencialmente obra divina, que só
com Deus e a partir de Deus se leva por diante, de modo
criativo e eficaz.
(...) Lembrando, a propósito, que a renovação
ou “reforma” da Igreja significa retomar a
“forma” que o Espírito de Cristo essencialmente
lhe deu, como novidade para o tempo todo. Isso mesmo que
a Conferência Episcopal Portuguesa propôs
na nota pastoral de abril de 2013 e eu procurei resumir
na homilia de 7 de julho passado, em termos de «comunidades
de acolhimento e missão». Sobretudo, o que
o Papa Francisco nos indica na exortação
apostólica Evangelii Gaudium, que temos como programa
para os próximos tempos, e é a substância
teórica e prática do caminho sinodal que
começamos.
Levemos no espírito e na letra, paróquia
a paróquia, instituto a instituto, associação
a associação, trechos como os seguintes
da exortação papal: «Sublinho que
aquilo que pretendo deixar expresso aqui, possui um significado
programático e tem consequências importantes.
Espero que todas as comunidades se esforcem por usar os
meios necessários para avançar no caminho
de uma conversão pastoral e missionária,
que não pode deixar as coisas como estão.
Neste momento, não nos serve uma “simples
administração”. Constituamo-nos em
“estado permanente de missão”, em todas
as regiões da terra» (Evangelii Gaudium,
25). E, mais concretamente, no que ao “funcionamento”
pastoral diz respeito: «Sonho com uma opção
missionária capaz de transformar tudo, para que
os costumes, os estilos, os horários, a linguagem
e toda a estrutura eclesial se tornem um canal proporcionado
mais à evangelização do mundo atual
que à autopreservação. A reforma
das estruturas, que a conversão pastoral exige,
só se pode entender neste sentido, fazer com todas
elas se tornem missionárias, que a pastoral ordinária
em todas as suas instâncias seja mais comunicativa
e aberta, que coloque os agentes pastorais em atitude
constante de «saída» e, assim, favoreça
a resposta positiva de todos aqueles a quem Jesus oferece
a sua amizade. Como dizia João Paulo II aos bispos
da Oceânia, “toda a renovação
na Igreja há de ter como alvo a missão,
para não cair vítima duma espécie
de introversão eclesial”» (EG, 27).
+ Manuel Clemente
Patriarca de Lisboa
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