O pão multiplica-se quando aceita
ser repartido. A gramática da Vida é a condivisão
1º - A primeira de todas as dívidas
soberanas, e certamente a mais fundamental, é aquela
que cada um de nós mantém para com a Vida.
Essa dívida nunca a pagaremos, nem ela pretende
ser cobrada. Reconhecer isso em todos os momentos, sobretudo
naqueles mais exigentes e confusos, é o primeiro
dos mandamentos.
2º - Se a maior de todas as dívidas
soberanas é para com um dom sem preço como
a vida, cada pessoa nasce (e cresce, e ama, luta, sonha
e morre) hipotecada ao infinito e criativo da gratidão.
A dívida soberana que a vida é jamais se
transforma em ameaça. Ela é, sim, ponto
de partida para a descoberta de que viemos do dom e só
seremos felizes caminhando para ele. É o segundo
mandamento.
3º - O terceiro mandamento lembra-nos
aquilo que cada um sabe já, no fundo da sua alma.
Isto de que não somos apenas o receptáculo
estático da Vida, mas cúmplices, veículos
e protagonistas da sua transmissão.
4º - O quarto mandamento compromete-nos
na construção. Aquilo que une a diversidade
das profissões e as amplas modalidades do viver
só pode ser o seguinte: sentimo-nos honrados por
poder servir a Vida. Que cada um a sirva, então,
investindo aí toda a lealdade, toda a capacidade
de entrega, toda a energia da sua criatividade.
5º - A imagem mais poderosa da
Vida é uma roda fraterna, e é nela que todos
estamos, dadas as nossas mãos. A inclusão
representa, por isso, não apenas um valor, mas
a condição necessária. O quinto mandamento
desafia-nos à consciência e à prática
permanente da inclusão.
6º - As mãos parecem quase
florescer quando se abrem. Os braços como que se
alongam quando partem para um abraço. O pão
multiplica-se quando aceita ser repartido. A gramática
da Vida é a condivisão. Esse é o
mandamento sexto.
7º - O sétimo mandamento
resume todos os outros, pois lembra-nos o dever (ou melhor,
o poder) da esperança. A esperança reanima
e revitaliza. A esperança vence o descrédito
que se abate sobre o Homem. A esperança insufla
de Espírito o presente da história. Só
a esperança, e uma Esperança Maior, faz
justiça à Vida.
José Tolentino Mendonça
|